À sombra das árvores

O guarda da entrada lateral do parque já sabia. Em dias alternados durante a semana e aos sábados, Teodora sempre iniciava a caminhada dando um abraço apertado – e que abraço! – nas suas “árvores de estimação”.

 

Dizia que as árvores conversavam com ela. Que a entendiam melhor até que os próprios filhos e o marido. Dava até a impressão de que trocavam segredos entre si. Costumava sussurrar junto a cada um das suas espécies preferidas. “Como vai? Senti tanto a sua falta…”

 

Aquela mulher se sentia realmente abraçada. Tanto que na hora de se soltar, suspirava. De felicidade. De emoção. “Sim, também sinto o mesmo.” Ao longo do percurso, para cada uma das árvores escolhidas, parecia cantarolar algo, bem baixinho.

 

A idade de Teodora? Sem querer parecer indiscreto, talvez algo em torno dos 60 anos. Tinha uma bela aparência e um olhar contemplativo. Usava óculos e os tênis sempre brancos, a ponto de dar a impressão de que nunca se sujassem.

 

Ah, ela tinha, por hábito, chamar as árvores por nomes próprios. O pau-brasil era tratado por Luiza; o jacarandá, Silvana; e o ipê, Mariazinha. Todas tinham sua própria denominação feminina. Mas por que somente nomes de mulheres? “Porque somente uma mulher é capaz de compreender a alma de outra. Ainda mais se ela tiver uma história não lá tão alegre”, dizia.

 

A caminhada pelo parque durava, em média, uma hora. E quando ia embora, Teodora parecia mais leve, mais livre. Livre dos problemas, livre das pessoas, livre de si mesma. Livre de uma vida mediana. Para tudo recomeçar em breve, muito em breve.

 

Em homenagem à Teodora e às “suas árvores”, eis a música da semana:

 

 

LUZ DO SOL

(Caetano Veloso)

Luz do sol
Que a folha traga e traduz
Em verde novo
Em folha, em graça
Em vida, em força, em luz…

 

Céu azul
Que venha até
Onde os pés
Tocam a terra
E a terra inspira
E exala seus azuis…

 

Reza, reza o rio
Córrego pro rio
Rio pro mar
Reza correnteza
Roça a beira
A doura areia…

 

Marcha um homem
Sobre o chão
Leva no coração
Uma ferida acesa
Dono do sim e do não
Diante da visão
Da infinita beleza…

 

Finda por ferir com a mão
Essa delicadeza
A coisa mais querida
A glória, da vida…

 

Luz do sol
Que a folha traga e traduz
Em verde novo
Em folha, em graça
Em vida, em força, em luz…

 

Reza, reza o rio
Córrego pro rio
Rio pro mar
Reza correnteza
Roça a beira
A doura areia…

 

Marcha um homem
Sobre o chão
Leva no coração
Uma ferida acesa
Dono do sim e do não
Diante da visão
Da infinita beleza…

 

Finda por ferir com a mão
Essa delicadeza
A coisa mais querida
A glória, da vida…

 

Luz do sol
Que a folha traga e traduz
Em verde novo
Em folha, em graça
Em vida, em força, em luz…

 

 

Aqui, o vídeo na voz, simplesmente, de Gal Costa…

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